Antes de ter o Barrio Adentro havia uma estrutura de saúde, sem dúvida que sim. Essa estrutura continua existindo e em dada medida continua funcionando como antes. Essa explicaçao que darei é fruto de conversas com pessoas do Departamento de Medicina Preventiva y Social da Universidad Centro-occidental Lisandro Alvarado e de uma visita que fiz essa manha.
Existe aqui uma rede de ambulatórios que conformava (e conforma) a Atençao Primaria em Saude e parte da Atençao Secundaria. Sao os ambulatorios rurais I e II e urbanos I, II e III.
O Ambulatório Rural I fica em regioes com populaçao pequena, dispersa e afastada dos grandes centros, com até 1.000 habitantes. O todo atendimento é feito por auxiliares. O Ambulatório Rural II fica em áreas rurais com mais de 1.000 habitantes, contam com médicos generalistas, às vezes com odontólogos e com macas (camas) de observaçao. Ambos serviços compoe a Atençao Primaria.
Os Ambulatórios Urbanos ficam em populaçoes com mais de 10.000 habitantes. Nos de tipo I médicos generalistas e às vezes odontólogos e trabalhadores sociais fazem atendimento de nível primario. Nos de tipo II presta-se atençao de nível primário e secundário, além dos médicos generalistas podem contar com serviços de obstetrícia, pediatria e outroas especialidades médicas, alguns exames laboratoriais e radiologia. É bastante heterogêneo o que se encontra em cada ambulatório. Os Ambulatórios de Tipo III funcionam 24h, contando com serviços de emergencia, medicina interna, cirurgia geral ambulatorial, pediatria, ginecologia, dermatologia e consultas em doenças sexualmente transmissíveis, contam também com serviços diagnósticos diversos como exames laboratorias, Raio-X, ecografia e endoscopia digestiva alta (de presença heterogenea entre os serviços)
Esses ambulatórios sao considerados uma porta de entrada para o sistema. Há também uma rede hospitalar vinculada a esses serviços, mas nao vou entrar neste tópico agora.
Alguns problemas que sao apontados nessa estrutura: os médicos sao contratados para trabalhar 20 horas semanais e têm dificuldades de fazer um planejamento que contemple visitas domiciliares. Há dificuldade na contrataçao de médicos, resultando em demanda grande para cada um. Existe um certo paralelismo com a estrutura dos Barrio Adentro. Algumas pessoas identificam há duas linhas de mando, dificultando a integraçao. Parece que alguns médicos cubanos nao tem seu diploma validado o que tem resultando em constrangimentos nas relaçoes com a estrutura tradicional (como para atestar óbito, por exemplo). Além disso em alguns lugares verifica-se um vício na implantaçao dos serviços, com ambulatórios tipo I e consultórios populares do Barrio Adentro sobrepondo-se em sua populaçao adscrita.
Um experiência - Ambulatório Tipo II de Cerrito Blanco (informaçoes fornecidas pela equipe e por professor que acompanhava - muchas gracias!)
É um ambulatório tipo II, com clientela de aproximadamente 53.000 habitantes. Conta com uma equipe de 38 trabalhadores entre profissionais de enfermagem, trabalhadoras sociais, odontólogos e médicos (5 médicos generalistas 20 horas, 2 pediatras, 1 cardiologista e especilistas de medicina interna). Boa parte da assistência é feita por docentes e alunos da Universidade.
A assistência também organiza-se por programas e atividades prioritárias. Ministério da Saúde solicita a existência de grupos (club) de gestantes, amamentaçao, hipertensao e diabetes.
Deve haver registros (que sao consolidados na equipe e enviados para o ministério da saúde, que faz outro consolidado) das insuficiências respistória e renal, diabetes, hipertensao, tuberculose, asma, de saúde mental, doenças sexualmente transmissíveis, nutricionais, hanseníase, leishmaniose, doenças de notificaçao compulsória (imediata ou semanal) e classificaçao de risco biológico, psicosocial e ambiental. Alguns programas específicos também devem ser registrados, em Pediatria valem-se do AIDPI (a resposta de cada pergunta deve ser registrada), também existem programas específicos para Diabetes (I, II e gestacional), enfermidades renais, insuficiência respiratória crônica, telemedicina abordando cardiopatias, saúde sexual e reprodutiva e planejamento (planificación) familiar. O calendário vacinal básico é muito semelhante, com o acréscimo de Hepatite A, Febre Amarela e Pentavalente no lugar da Tetravalente. As visitas domiciliares sao realizadas pela enfermagem e trabalhadores sociais, médico somente quando requisitado.
Acompanho um grupo de amamentaçao (lactancia). Uma aluna de sexto ano de Medicina o conduz. Conduz com desenvoltura e estimulando a participaçao da maes. Nossos recém-formados nem de longe saem com essa capacidade, nao aprendemos a trabalhar com grupos na atençao básica. Muitas sao as experiencias de "ambulatorios da universidade" dentro de nossos centros de saúde, a integraçao real é mínima. Bom depois falo mais disso.
Sao aproximadamente 15 maes. De varias idades, com experiências variadas. Participam da atividade com atençao. Algumas tem que lidar com suas crianças (niños) chorando, andam pela sala livremente, entram e saem tentando acalmar suas crianças. Outras desviam a atençao para... amamentar, claro. Enquanto isso, discutem sobre as vantagens do aleitamento para a criança, para a mae, para a familia e também para o país! Em algum momento, depois de intervençoes de pessoas um pouco mais externas àquela grupalidade, a atividade torna-se um pouco mais prescritiva. Mas está ótimo! Já rendeu bastante coisa! Algumas maes estao preparando-se, depois de completar 6 meses de amamentaçao exclusiva há uma pequena celebraçao, como uma formatura dos bebês que alcançaram esta marca. Em breve haverá uma festa dessa.
Amanha devo visitar outro serviço como este, outro ambulatório e acompanhar outro grupo de alunos. Entao tecerei algumas opinioes sobre esses serviços e comentarei um pouco sobre como é a inserçao da universidade nos serviços de atençao primaria. Falando nisso, quinta e sexta estarei em Caracas, devo participar de uma reuniao exatamente sobre isso. Caso nao escreva até amanha, será por falta de tempo para faze-lo antes de viajar.
Um comentário:
é Bruno pelo que relata parece que a atenção primária e secundária ai é muito mais ativa que a daqui, imagino que isto aconteça devido as equipes serem bem estruturadas fornecendo desta forma a referencia à população; enquanto que no Brasil a primeira referencia é a terciária (hospitalar), sem contar que em muitos locais a atenção secundária não é muito estruturada em nosso País.
Vale lembrar que o sistma de saúde pública de Curitiba - PR me parece (pelo que você relata) ao que melhor se assemelha às condições do sistema relatado.
Meus parabéns.....
Besos
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